quarta-feira, dezembro 28, 2011


No palco


A percussão sobe. Demasiado. É um crescendo. Vejo as cabeças iluminadas e com reflexos. Nas palmas há cânticos de negros a ecoar "She likes". Eu também gosto. Ao longe vejo de perto os olhares. Quem queima por dentro? O que perturba a turba? Querem ver alguém que lhes estenda a mão e jamais a dê realmente, que se mantenha distante. Distancio-me. Aproximo-me. Quem sou? Podes dizer-me tu, querido? Podes dizer que tenho o mau hábito de voltar costas e ir-me embora sem me despedir, de desaparecer sem que esperem tal de mim, quase sempre pronta a esclarecer todas as dúvidas com os meus devaneios filosóficos. Não. Não tenho tantas respostas assim. Aliás, vê como tenho frio com tanta multidão à minha frente e atrás de mim. Fico cansada. Querem que continue o jogo e não desista. Olho em frente e os vossos olhares fazem-me chorar. Tinha tanto para vos dar. Sabem, quase enlouqueço com a quantidade de informação que me querem transmitir. Sim, é muita coisa e estou já à beira de um abismo. Há luz suficiente para este concerto. Um jogo de luzes e máquina de fumos sobejando no bolso. O meu vestido iluminar-se-á e pedir-me-ão os previsíveis encores, como um ritual a que se habituaram, já mesmo estando sem paciência. Querem ir-se embora, eu sei. Não somos conhecidos, não temos álbum nem produtor. Somos uns croquis caídos não se sabe de onde com um não sei quê de amador. Mas sabem...demos um abraço todos antes das cortinas se abrirem. Esse abraço foi a nossa salvação. Depois foi a continuação do abraço e eu estava a carecer de uma adrenalina assim, percorrendo os meus dias de versos interrompidos.